quinta-feira, 23 de maio de 2013

Maria e Palavra de Deus

Não podia, portanto, a Palavra de Deus, a Bíblia Sagrada, calar-se a respeito da mais sublime de suas criaturas. Apresentaremos um pequeno resumo de como as Sagradas Escrituras exaltam e testemunham às qualidades, as virtudes de Nossa Senhora:
·       "Entrando o anjo disse-lhe: Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo" (Lc 1, 28): Quando a Igreja chama Maria de "Imaculada Conceição" quer dizer que a mesma, desde o momento de sua concepção foi isenta - por graça divina - do pecado original. Pois, onde existe esta "graça transbordante" não pode coexistir o pecado. Por isso, esta boa Mãe é também chamada pelos seus servos de "Santíssima Virgem". Os santos ensinaram que não convinha a Jesus Cristo, o Santíssimo, ser gerado e nascer de uma criatura imperfeita. Como podia o Santíssimo Deus, Jesus Cristo ser depositado num receptáculo que não fosse digno dEle? Pois ele mesmo testemunha no Evangelho, que não se coloca vinho novo e bom em odres velhos e defeituosos (conf. Lc 5, 37). Eis porque o Criador elevou Maria, este "Vaso Insigne de Devoção" a tão grande santidade.
·       "Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra" (Lc 1, 38): Maria ao dizer seu "sim" incondicional ao convite de Deus, introduz no mundo o Verbo Divino, Jesus Cristo. E, fato assombroso: torna-se a única criatura a gerar o seu Criador segundo a natureza humana. Maria iniciou com sua sagrada gravidez o restabelecimento da concórdia entre Deus e os homens conforme está escrito: "Por isso, Deus os abandonará, até o tempo em que der à luz aquela que há de dar à luz" (Mq 5,2). Com este sim incondicional Maria cumpre também a primeira de todas as profecias registrada na história da humanidade. Porque com esta sua doação total ela fere a cabeça do demônio (Gn 3,15) e começa a devastar o seu reino de morte, que será destruído totalmente pelo seu filho Jesus.
·       "Doravante todas as gerações me chamarão bem-aventurada" (Lc 1, 48): Os santos proclamam a profunda intimidade dela com a Santíssima Trindade: Filha de Deus Pai, esposa do Espírito Santo, mãe de Deus Filho! O Espírito Santo profetiza pelos lábios de Maria, que daquele momento em diante de geração em geração, isto é, para sempre, todos os cristãos proclamariam sua bem-aventurança.
·       "Donde me vem esta honra de vir a mim a mãe do meu Senhor?" (Lc 1, 43): Isabel, mulher idosa e santa, esposa de Zacarias, mãe de João Batista desmancha-se em elogios àquela jovem que foi até sua casa para servir! O Espírito Santo mesmo ensina, que o louvor dirigido aos pais é grande honra para o filho (Cf Eclo 3, 13 ). Os verdadeiros filhos de Maria, em todos os tempos, lugares e momentos, exaltam a Virgem, imitando o exemplo de Santa Isabel.
·       "Pois assim que a voz da tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança estremeceu de alegria no meu seio" (Lc 1, 44): Cristo testemunhou a respeito de João Batista: "dos nascidos de mulher nenhum foi maior que João" (cf. Lc 7 28). Pois bem. Não é proveitoso para os cristãos imitarem o gesto de São João Batista? Bendito os servos de Deus, que não se cansam de se alegrar e cantar os louvores de Nossa Senhora, imitando assim o gesto do Divino Esposo e de São João Batista, o maior profeta da Antiga Aliança.
·       "E uma espada transpassará a tua alma" (Lc 2, 35): Uma lança transpassou o coração do Cristo na Cruz. Uma espada de dor transpassou o coração de Maria no Calvário! Deus revela ao profeta Simeão como Nossa Senhora estaria intimamente ligada à Jesus Cristo no momento da Sagrada Paixão. Ninguém em toda a terra, em todos as épocas, esteve mais intimamente ligado a Jesus naquele dramático momento que sua Santíssima Mãe. Portanto que, junto com o sacrifício expiatório, doloroso e único de Jesus Cristo no Calvário, subiu também aos céus, como oferta agradabilíssima diante de Deus, o sacrifício doloroso de Nossa Senhora.
·       "Como viesse a faltar vinho, a mãe de Jesus disse-lhe: ‘Eles não tem mais vinho’. Respondeu-lhe Jesus: ‘Mulher, isso compete a nós? Minha hora ainda não chegou’. Disse então sua mãe aos serventes: ‘Fazei o que ele vos disser’" (Jo 2, 3–5): Na festa do casamento de Canaã Jesus iniciou seu ministério. Ministério aliás composto por pregação e "obras" (milagres). A Santíssima mãe percebeu a dificuldade daquela família, que não tinha vinho para os convidados e comunicou ao seu Filho. Jesus afirmou então claramente a Maria que, ainda não era o momento para iniciar seu ministério com um prodígio, pois disse: "minha hora ainda não chegou". Sem discussão, na mais plena confiança, diz aos serventes: "façam o que ele lhes disser". Grandíssima confiança! Sua intercessão é infinitamente mais eficaz do que as orações de todos os santos que pedem sem cessar pelos habitantes da terra ( Cf. Ap 6, 9-10 . 8, 3-4 ; II Mac 15,11-16 ).
·       "Disse-lhe alguém: ‘Tua mãe e teus irmãos estão aí fora, e querem falar-te’. Jesus respondeu: ‘Quem são meus irmãos e minha mãe? (...) Eis aqui minha mãe e meus irmãos. Todo aquele que faz a vontade de meu Pai, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe’ (Mt, 47,49-50): "Quem são meus irmãos e minhas mãe?" pergunta o Cristo. E aponta para os seus discípulos: "eis aqui a minha família!". E, doravante, somente os que forem discípulos do mestre, ouvindo as suas palavras e as cumprindo poderão pertencer plenamente a esta família. Por isto, como doce discípula Maria "conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração" (Lc 2, 19.51) Meditava e as guardava! Eis o exemplo da perfeita discípula. Maria com efeito não é mãe apenas na carne, mas na vida toda, na alma e na total obediência ao seu Divino Filho.
·       Alguns, que ainda não amam suficientemente a Santíssima Virgem, usam estes versículos acima justamente contra ela, tentando convencer-nos de que Jesus a teria desprezado naquele momento. Esses "estudiosos da Bíblia" esquecem que Jesus jamais desprezaria sua mãe, conforme ensina o próprio Espírito Santo: "Apenas o filho insensato despreza sua mãe" (Pr 15, 20). Pelo contrário, Jesus obedeceu a Deus Pai e procurou fazer sua vontade: "Honra teu Pai e tua Mãe" (Ex 20,12 e Deut 5,16 ).
·       "Quando Jesus viu sua mãe e perto dela o discípulo que amava, disse à sua mãe: ‘Mulher, eis aí teu filho’. Depois disse ao discípulo: ‘Eis aí tua mãe’" (Jo 19, 26-27): O apóstolo João aos pés da cruz, o único discípulo presente, representava todos os discípulos. Neste momento Jesus consagrou Maria, Mãe espiritual dos apóstolos. Mais ainda: João representava também, todos os homens e mulheres, de todos os lugares e de todos os tempos, que a partir daquele momento ganharam Maria como sua Mãe espiritual. Isto está de acordo com o testemunho do próprio São João, que em outra parte diz: "O Dragão se irritou contra a mulher (Maria) (...) e sua descendência, aqueles que guardam os mandamentos de Deus (...)" (Ap 12,17).
·       Maria Santíssima não teve outros filhos naturais. Permaneceu sempre virgem, como era do conhecimento universal dos primeiros cristãos até os nossos dias. Mas, muitos insistem em "presenteá-la" com filhos naturais que ela não teve. Fazem isto, para diminuírem a glória de Jesus Cristo, bem como para esvaziarem Maria de sua maternidade universal. Se Jesus tivesse irmãos carnais, não teria entregue sua Mãe aos cuidados de João Evangelista. Seus próprios irmãos naturais cuidariam dela, como era dever sacratíssimo na época e ainda hoje. Além disso, citam aqueles que não amam a Virgem Maria algumas passagens bíblicas como a seguinte: "Não se chama a sua mãe Maria e os seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas?" (Mt 13,55) Querendo com isto provar que Nossa Senhora teve outros filhos. Esquecem ou ignoram, que nos tempos de Cristo todos os parentes se chamavam entre si de irmãos. E a própria Bíblia prova isto, pois dos quatro "irmãos" acima citados, lemos que a verdadeira mãe de Tiago e José era uma outra Maria, irmã de Nossa Senhora e casada com Cleofas ( Jo 19,25 e Mc 15,40 ). E que Judas era irmão de Tiago Maior (Jd 1,1) filho de Alfeu (Mt 10,2-4). Ou seja, ninguém era filho natural de Maria e José. Eram de sua parentela, mas não de sua filiação. Além disso, os primeiros cristãos, que conheceram Jesus e os apóstolos, nos escritos que nos deixaram, todos testemunharam que Maria sempre permaneceu virgem, não tendo jamais outros filhos. Sobre estes inventores de novidades a Bíblia nos previne: "Haverá entre vós falsos profetas (...) muitos seguirão as suas doutrinas dissolutas (...) e o caminho da verdade cairá em descrédito" (II Pe 2,1-2).
·       "E desta hora em diante o discípulo a levou para a sua casa" (Jo 19,27): Daquela hora em diante, S. João levou a Santa Mãe para sua casa. Primeiramente para sua "casa espiritual", sua alma. Esse é o motivo pelo qual era o discípulo que Jesus mais amava, porque também, era o discípulo mais afeiçoado a ela. Depois, levou-a para sua casa material, seu lar. Hoje sua presença maternal poderá ser recordada através de quadros e imagens (conf. Nm 21, 8-9 ; Ex 25, 18-20 ; I Reis 6,23-28 etc) l.
·       "Todos eles perseveravam unanimemente em oração, juntamente com as mulheres, entre elas Maria mãe de Jesus, e os irmãos dele" (At 1,14): No cenáculo, no dia de Pentecostes, Maria juntamente com os discípulos suplicavam para que viesse o Espírito Santo sobre todos. E assim foi fundada a Igreja naquele dia. Maria uma vez tendo introduzido o Cristo no mundo, depois tendo inaugurado seu ministério nas bodas de Canaã, agora intercede, introduzindo e inaugurando a ação do Espírito Santo sobre a Igreja nascente. Eis a mãe da Igreja com seus filhos.
·       "Apareceu em seguida um grande sinal no céu: uma Mulher revestida de sol, a lua debaixo dos seus pés e na cabeça uma coroa de doze estrelas" (Ap 12, 1): No Apocalipse, João contempla nesta visão três verdades: a Assunção de Nossa Senhora, sua glorificação, sua maternidade espiritual. O Apocalipse descreve que esta mulher "estava grávida e (...) deu à luz um Filho, um menino, aquele que deve reger todas as nações..." (Ap 12,2.5). Qual mulher, que de fato, esteve grávida de Jesus senão a Santíssima Virgem? (Cf. Is 7,14). Outros contestam, dizendo que esta mulher é símbolo da Igreja nascente. Mas, a Igreja nunca esteve "grávida" de Jesus Cristo! Antes, foi Cristo que gerou a Igreja, foi ele que a estabeleceu e a sustenta. E para provar que esta mulher é exclusivamente Nossa Senhora, em outro lugar está escrito: "O Dragão vendo que fora precipitado na terra, perseguiu a Mulher que dera à luz o Menino" (Ap 12,13). A Igreja teria dado à luz a um Menino? Evidente que não! Portanto esta mulher refulgente é Nossa Senhora, pois foi ela unicamente que gerou "o menino" prometido (Cf. Is 9,5). Diz ainda a Sagrada Escritura que: "(o Dragão) deteve-se diante da Mulher que estava para dar à luz (...) para lhe devorar o Filho (...) A Mulher fugiu para o deserto, onde (...) foi sustentada por mil duzentos e sessenta dias" (Ap 12,4.6). De
·      Portanto, todos esses versículos, confirmam primeiramente a assunção de Nossa Senhora. Pois o apóstolo a contempla revestida de sol, já estabelecida desde agora na glória prometida pelo seu Filho, quando diz "Os justos resplandecerão como o sol" (Mt 13,43). Confirma incontestavelmente sua realeza espiritual, pois a mesma se apresenta coroada com doze estrelas, símbolo das doze tribos de Israel e dos doze apóstolos. Portanto Rainha do Antigo e do Novo Testamento. Por fim confirma sua maternidade espiritual, pois diz o Espírito Santo: "(O Dragão) se irritou contra a Mulher (Maria) e foi fazer guerra ao resto de sua descendência (seus filhos espirituais), os que guardam os mandamentos de Deus e têm o testemunho de Jesus" (Ap 12,17).

Cristo centro do Universo (Ef 1,3-14; Cl 1,15-20; Fl 2,6-11)



A intenção no coração de Deus ao ter trazido este universo à existência era que, ao final, toda a criação pudesse apresentar a glória e a supremacia de Seu Filho, Jesus Cristo. Isto nos afirma a carta de São Paulo neste pequeno fragmento “nele tudo subsiste” (Cl 1,17 ). Ele diz muito claramente que, se não fosse o Senhor Jesus Cristo, o universo inteiro se desintegraria, desmembrar-se-ia; ele estaria sem seu fator unificador; ele cessaria de ter uma razão para ser mantido como uma completa e concreta unidade. Tire-o fora e a criação perde seu propósito e seu objeto, e não precisa mais ir adiante. “Cristo é tudo, e em todos” (Cl 3,11) era o pensamento – o pensamento dominante – na mente de Deus durante a criação do universo.
Percebemos esta verdade claramente exposta na antífona da solenidade de Cristo Rei: “O Cordeiro que foi imolado é digno de receber o poder, a divindade, a sabedoria, a força e a honra. A ele a glória e poder através dos séculos” (Ap 5,12; 1,6). Isto é proclamado ao final de cada ano litúrgico para nos lembrar que Jesus Cristo é o Rei de nossas vidas, Rei da história, Rei do cosmo, Rei do universo. A Igreja toda canta, na festa de Cristo Rei, na sua oração: “Cristo Rei, sois dos séculos Príncipe,/ Soberano e Senhor das nações!/ Ó Juiz, só a vós é devido/ julgar mentes, julgar corações”. O texto do Apocalipse citado acima dá o sentido da realeza de Jesus: “ele é o Cordeiro que foi imolado”. É Rei não porque é prepotente, não porque manda em tudo, até suprimir nossa liberdade e nossa consciência. É Rei porque nos ama, Rei porque se fez um de nós, Rei porque por nós sofreu, morreu e ressuscitou, Rei porque nos dá a vida. Ele é aquele Filho do Homem apresentado no livro de Daniel: “Foram-lhe dados poder, glória e realeza, e todos os povos, nações e línguas o serviam: seu poder é um poder eterno que não lhe será tirado, e seu reino, um reino que não se dissolverá” (Dn 7, 9-14 ). Com efeito, o reinado de Cristo não tem as características dos reinados do mundo.
Ele é Rei não porque se distancia de nós, mas precisamente porque se fez “Filho do homem”, solidário conosco em tudo. Ele experimentou nossas pobrezas e limitações; ele caminhou pelas nossas estradas, derramou o nosso suor, angustiou-se com nossas angústias e experimentou tantos dos nossos medos (Fl 2,6-11;). Ele morreu como nós, de morte humana, tão igual à nossa. Ele reina pela solidariedade. Ele é Rei porque nos serviu: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mc 10,45). Serviu com toda a sua existência, serviu dando sempre e em tudo a vida por nós, por amor de nós. Ele reina pelo amor. Ele é Rei porque tudo foi criado pelo Pai “através dele e para ele” (Cl 1,15-16); tudo caminha para ele e, nele, tudo aparecerá na sua verdade: “Quem é da verdade, ouve a minha voz”. É nele que o mundo será julgado. Ele é Rei porque é o único que pode garantir nossa vida; pode fazer-nos felizes agora e pode nos dar a vitória sobre a morte por toda a eternidade: “Jesus Cristo é a testemunha fiel e verdadeira, o primeiro a ressuscitar dentre os mortos, o soberano dos reis da terra”. Ele reina pela vida.Sim, Jesus é Rei: A marca e o critério da realeza de Cristo é e será sempre, a cruz!
Hoje, assistimos, impressionados, a paganização do mundo, e perguntamos: onde está a realeza do Cristo? – Onde sempre esteve: na cruz: “O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui”. O Reino de Jesus não é segundo o modelo deste mundo, não se impõe por guardas, pela força, pelas armas: meu Reino não é daqui! É um Reino que vem do mundo do amor e da misericórdia de Deus, não das loucuras megalomaníacas dos seres humanos. E, no entanto, o Reino está no mundo: “Cumpriu-se o tempo; o Reino de Deus está próximo” (Mc 1,15); “Se é pelo dedo de Deus que eu expulso os demônios, então o Reino de Deus já chegou para vós” (Lc 11,20). O Reino que Jesus trouxe deve expandir-se no mundo! Onde ele está? Onde estiverem o amor, a verdade, a piedade, a justiça, a solidariedade, a paz. O Reino do Cristo deve penetrar todos os âmbitos de nossa existência: a economia, as relações comerciais, os mercados financeiros, as relações entre pessoas e povos, nossa vida afetiva, nossa moral pessoal e comunitária.
Tudo deve convergir para Jesus Cristo: o tempo, a história, o cosmo... tudo corre para Jesus: ele é “o Alfa e o Ómega, o A e o Z, o Primeiro e o Último” (Ap 1,8; 21,6; 22,13) “Jesus Cristo é a Testemunha fiel, o Primogénito dentre os mortos, o Soberano dos reis da terra” (Ap 1,5). “A ele a glória pelos séculos dos séculos. Amém (Ap 1,6).

AS APARIÇÕES DE NOSSA SENHORA: A IMPORTÂNCIA E ENSINAMENTOS



introdução[1]
Apesar das restrições que os protestantes fazem ao culto de Nossa Senhora, os católicos se sentem honrados e privilegiados por terem com Mãe a mesma mãe do Salvador. E quem nos deu Mãe tão especial foi nada menos que o próprio Jesus: “Eis aí teu filho...”(Jo 19,26). Este Ano Mariano quer manifestar nosso amor e nossa gratidão a Deus por ter criado uma mulher tão maravilhosa e por tê-la dada como nossa advogada e intercessora. Queremos também reavivar nossa devoção a Maria recorrendo à conversão como ela tantas vezes nos pediu. Nossos Círios e nossas Festas patronais dever se tornar um estímulo sempre mais forte para que esta Mãe se sinta sempre em casa nos nossos corações, nas nossas paróquias e na nossa diocese.
Não é somente Nossa Senhora que marca presença nas aparições. Jesus também apareceu. A mais famosa aparição de Jesus foi em 1673, em Paray-le-Monial, na França, a Santa Margarida Maria Alacoque. E com a permissão de Deus, qualquer santo ou demônio poderia aparecer.
Nesta palestra faremos menção de algumas aparições de Nossa Senhora (Guadalupe {1531}, La Salette {1846}, Lourdes {1858} e Fátima{1917}). Delas salientaremos os pontos mais importantes lembrados por Nossa Senhora a fim de que possamos ainda hoje pôr em prática os conselhos por ela transmitidos aos privilegiados videntes.

Valutação das aparições por parte da Igreja
Parece exagerado, mas não é: as aparições de Nossa Senhora podem representar um sério perigo para a fé de nossos fiéis. De fato poderiam ser consideradas manifestações de Nossa Senhora alucinações que alguém, de mente fraca, poderia ter. Podem existir charlatães que para tirar proveito inventam aparições que nunca existiram. Outros, para aparecer, se fazem de videntes e transmissores de mensagens celestiais. Outros ainda, sugestionados por outras aparições, revivem em si o que aconteceu com outros. Não é preciso recorrer sempre a má fé para julgar estes fatos e estas pessoas. Tirando os aproveitadores conscientes, podem existir pessoas que de verdade pensam que estão vendo alguma coisa e externam estas visões identificando-as normalmente com Nossa Senhora. Mas, ainda assim, não podemos correr o perigo de crer em imaginações ou fantasmas. Precisamos de critérios sérios para avaliar as aparições a fim de sustentar nossa crença e não banalizá-la. O costume da Igreja a este respeito é antigo e tem suas raízes nos critérios ditados pelo papa Bento XIV desde o século XVIII. Quando é preciso analisar uma presumida aparição precisa:
1.     Realizar o exame completo dos fatos;
2.     Verificar se as mensagens são coerentes com os ensinamentos da Igreja;
3.     Constatar a transparência dos acontecimentos de forma que a aparição se torna um serviço à Igreja e não pode causar protagonismo dos videntes ou origem de ritos bizarros;
4.     Verificar se tem sinais pelos quais Deus confirma sua presença;
5.     Constatar se os frutos verdadeiros são os da conversão e da volta a Deus;
6.     Que o bispo do lugar se pronuncie sobre a naturalidade ou não dos fatos.
Com isso é claro que a Igreja, apesar de admitir que as aparições possam existir, antes de confirmar tal fenômeno quer ver claro nos acontecimentos. Só depois de ter esgotado todas as outras possibilidades que poderiam provocar aparições é que então, na presença de milagres, ela reconhece a autenticidade das aparições.

Importância de Maria na vida da igreja
Desde a entrega da humanidade a Maria por parte de Jesus na cruz, Maria ganhou um lugar privilegiado no coração da Igreja e no coração dos cristãos. Todos os santos são venerados na Igreja. Mas só Maria recebe uma veneração especial (hiperdulia) que se repete várias vezes ao ano, sobretudo na ocasião dos fatos mais salientes da nossa salvação. Bem além de um sentimentalismo estéril, existe na Igreja um sentimento de gratidão e verdadeiro amor pela Virgem Mãe de Deus. O que importa é Jesus, o seu Salvador. Mas Jesus, gerado em Maria por obra do Espírito Santo, foi por ela dado ao mundo. Amando seu Filho Jesus, Maria amou a Igreja toda e de todos os tempos, que em Jesus nasceria e viveria. Antes, com a entrega de João como filho, todos fomos confiados e recebidos como filhos por esta Mãe incomparável. Sentimos sua presença nas festas que a ela tributamos e a honramos como Mãe e Rainha nos privilégios com que o Pai se dignou enriquecê-la. Pedimos sua proteção sem complicações, com naturalidade, pois nos consideramos verdadeiros filhos e filhas dela. Em sua honra erguemos igrejas e templos belíssimos, ricos de arte, de história e de amor. E ela nos leva a sério, obtendo-nos graças sobre graças e às vezes aparecendo entre nós e falando-nos.
Mas tudo isso pode acontecer pela devoção sincera que o povo tributa à Virgem Maria e pela intercessão constante que ela exerce lá no céu a nosso favor. Não precisaria que ela aparecesse para nós. Quais são, então, o valor e a necessidade das aparições? O Pe. Estevão Flores explicou muito bem ao escrever “a importância das aparições da Virgem não consiste no fato que iluminam ou chamam a atenção sobre pontos importantes do Evangelho. Ela consiste mais num grito de alarme para uma comunidade cristã que poderia adormecer nas atitudes costumeiras da vida... Elas preenchem vazios e, mediante livros que se escrevem para explicá-las, obrigam estudiosos a aprofundá-las... e animam os fiéis a se inteirarem sobre a vida da Igreja”.

Mensagens que podemos aprender das aparições de Nossa Senhora (Guadalupe {1531}, La Salette {1846}, Lourdes {1858} e Fátima{1917}):

1.     Centralidade de Jesus Cristo: O que aparece logo em todas as aparições de Nossa Senhora é uma forte preocupação de despertar nos cristãos o amor de Deus pelos homens. Parece mesmo que a Nossa Senhora interessa muito esta mensagem: voltai a amar Jesus, que é o amor do Pai vivo e presente no meio de vós. A La Salette Maria chora pelos pecados dos homens que se afastaram de seu Filho. Queixa-se porque não agüenta mais sustentar o braço castigador de Jesus contra a humanidade pecadora. Em Fátima um anjo antes, e depois Nossa Senhora, convida a fazer obras de expiação contra os números pecados que ofendem a Deus. O mesmo pediu Nossa Senhora em Lourdes. A finalidade destes chamados insistentes é sempre a mesma: parar de desconhecer o amor que Deus tem mostrado à humanidade através de seu Filho Jesus. Em Guadalupe tinha se verificado um episódio bastante importante. Alguns missionários franciscanos que tinha chegado da Espanha até o México, foram ter com os majorais dos Índios Astecas para terminarem sua idolatria e seus antigos costumes; mas a resposta foi incisiva: “E agora, nós devemos destruir a nossa antiga regra de viver”?. E continuaram a levar em frente seus costumes. Mas o verdadeiro Deus estava preparando sua estratégia pra que aquele povo conhecesse e honrasse Jesus Cristo. Tudo mudou, de fato, oito anos depois daquela conversa: quando “a antiga rega de vida foi abandonada espontaneamente” (Oscar Quevedo, Nossa Senhora de Guadalupe). Em dezembro de 1531, o índio Juan Diego recebia a visita de Nossa Senhora na coluna de Tepeyac pedindo que lá o povo se reunisse numa capela para rezar. Em pouco tempo oito milhões de índios astecas pediram ao Batismo. O que os maiorais astecas e os missionários franciscanos não tinha obtido, Nossa Senhora obteve: Nosso Senhor começou  a ser amado e honrado por aquele povo que até então honrava ídolos com ritos e liturgias pagãs. E o amor a Jesus foi tão grane que ainda depois de gerações e gerações, o povo do México foi capaz de lutar e enfrentar o martírio durante a dominação maçônica de começo de 1990
2.     Oração: Não se volta a Jesus Cristo sem algumas condições. A primeira é a oração. Sem oração Jesus se torna alguém distante, fora da nossa vida, uma espécie de tapa-buraco que deve ser invocada como último recurso quando não se tem mais saída e não sabemos mais a quem nos dirigir. Para que Jesus esteja sempre vivo em nossas vidas é necessária a oração. O pedido, a respeito da oração, é uma constante em todas as aparições de Nossa Senhora. Todas, também aquelas que nós aqui não analisamos. Um pequeno episódio de Fátima pode nos esclarecer. Os partorzinhos estavam acostumados a rezar o terço todo dia. Mas a forma da oração não era muito ortodoxa. De fato rezavam Ave Maria e logo respondiam Santa Maria. Desta forma, rapidinho terminavam o terço. Um anjo, antes das aparições de Nossa Senhora, apareceu e consertou a oração e ensinou a eles outra bonita que rezaram até a morte: “Meu Deus, eu creio, adoro, espero e vos amo. Peço-vos perdão por aqueles que não crêem, não adoram, não esperam e não vos amam”. Muitas vezes Nossa Senhora pede a construção de capelas nos lugares das aparições. Este foi o pedido, por exemplo, que ela fez a Juan Diego em Guadalupe. A finalidade das capelas é sempre reunir os cristãos para rezarem e ela poder ajudar os que a invocam. Insistindo sobre a oração Maria nda mais faz senão confirmar com força o que Jesus já tinha ensinado através da parábola da viúva e do juiz injusto: é preciso rezar sempre sem nunca desistir (cf. Lc 18,1-8). Além disso, no Evangelho são inúmeras as vezes que Jesus fala da oração. E com seu exemplo de filho orante quantas vezes se transforma num incentivo para rezarmos mais: mestre ensina-nos a rezar (cf. Lc 1,1).
3.     O pecado: ofensa contra Deus: Em todas as aparições a presença do pecado é marcante. Não existe o pecado sozinho: existem homens que fazem pecados. Em La Salette Maria se queixa, chorando, dos sacerdotes que se desviaram da doutrina do Evangelho correndo atrás de novas ideologias. Em Fátima a insistência sobre a oração para a salvação dos pecadores é constante. Um dia os pastorzinhos têm a visão do inferno com almas sendo jogadas pelas chamas eternas. Em Lourdes nossa Senhora pede oração e penitência para a conversão dos pecadores. E a aparição de Guadalupe descongelou os corações dos índios que ainda adoravam os ídolos. O pecado é ofensa contra a bondade de Deus. E o pecador ofende a Deus desprezando a vida recebida no Batismo. A ira de Deus poderia ser muito grande. É assim que fala Nossa Senhora em La Salette e em Fátima. Cabe à Virgem sustentar o braço pesado do Senhor que quer castigar a humanidade. E ela faz este trabalho de intercessora porque o pecador é importante: para ele também Jesus morreu. E o que Nossa Senhora quer é que ele se salve deixando de pecar. É por isso que continuamente pede penitências e orações pelos pecadores. Fazendo isso Maria segue os passos de seu Filho Jesus que veio para os pecadores e não para os justos. De fato, morrendo por todos para que tivéssemos vida e a tivéssemos em abundância, Jesus nos diz que todos somos pecadores e que precisamos continuamente de conversão. As aparições de Nossa Senhora nos lembram esta situação perigosa em que cada um de nós se coloca e nos convidam a ficar prudentes para fugir das tentações e das oportunidades de pecado;
4.     Expiação e Sacrifício: Outra característica importante das aparições de Nossa Senhora é a insistência sobre o sacrifício e a oração em expiação dos pecados dos outros (além dos pessoais). O ponto de partida para entender esta maneira de agir de Nossa Senhora é o exemplo de Jesus. De fato Jesus, o inocente por excelência, pagou com sua vida pelos nossos pecados. Deste resgate é que veio para a humanidade toda possibilidade de voltar à comunhão com o Pai. Maria pede aos videntes (e por eles aos cristãos) que façam como Jesus: que ofereçam sacrifícios e orações para obter o perdão dos pecados daqueles que nem ligam com os pecados que fazem. Jesus ainda ensinou-nos que não tem maior amor que dar a vida pela pessoa amada. Pedir pelo pecador junto de Deu é certamente a concretização deste amor formidável que Jesus falava. Na vida dos santos que levaram a serio este tipo de súplica diante de Deus, os exemplos de salvação de pecadores são muito numerosos. Só um exemplo: Santa Teresinha do Menino Jesus obteve a conversão in extremis de um condenado à morte na França no fim de 1800. Contudo na maioria dos casos estas conversões ficam escondidas. De fato este é um trabalho da Graça de Deus junto ao coração de cada homem. Baste pra nós sabermos que o caminho está certo porque o próprio Jesus o percorreu;
5.     O terço: Era lógico que Maria, aparecendo, divulgasse a oração do terço: a oração de Maria por excelência. É o que aconteceu em Fátima, Lourdes e La Salette. Pareceria vaidade de Nossa Senhora: ela ensinar a rezarmos a ela própria! Mas não é bem assim. De fato o Terço é uma oração cristológica, que visa primeiramente a pessoa de Jesus Cristo. É fácil entender por quê. Sempre tem uma enunciação dos mistérios e estes mistérios sempre se referem a episódios do Evangelho que, diretamente ou indiretamente, falam de Jesus. Enunciados os mistérios, somos convidados a meditar e contemplar aqueles episódios fazendo-nos acompanhar pela recitação das dez “Ave Marias” costumeiras, e terminando com o “Glória ao Pai”. Desta forma Maria não chama a nossa atenção para cima dela, mas nos acompanha na contemplação da vida e das obras de Jesus a nosso favor. O Terço nos leva a conhecer melhor Jesus e seu amor por nós. Ele é para nós sermos mais cristãos acompanhados e encorajados por Maria;
6.     Os castigos de Deus: Nas aparições aparecem muitas vezes os castigos e as ameaças de castigo de Deus para coma a humanidade. Em Fátima até as crianças que presenciavam a aparição de Nossa Senhora tiveram uma terrível visão do Inferno como suplício supremo dos pecadores. A Deus não importa muito nos amedrontar. Deus quer amor e não terror. A La Salette Nossa Senhora se queixa do peso braço ameaçador do Filho tão ofendido, sobretudo por aqueles que deveriam amá-Lo e fazê-Lo amar pelos homens. Em Fátima, ainda Nossa Senhora que apareceu já quase no final da primeira guerra mundial, ameaça o início de uma segunda guerra mundial se os homens não se converterem. E dá um sinal premonitório: uma luz estranha no céu. Outra desgraça ameaçada em Fátima foi a implantação do Comunismo Ateu na Rússia e seus domínios, causando perseguições e mortes. Durante a história do povo de Israel Deus muitas vezes recorreu aos castigos. De fato os profetas muitas vezes ameaçaram com castigos divinos o Povo Eleito pela sua perversa conduta e pediam pronta conversão. Afinal, o que interessa Deus é que o homem se aproxime sempre mais ao seu Senhor com uma conversão constante. Ameaças e castigos têm de fato esta finalidade: incentivar sempre mais a conversão. Trata-se daquela poda que Jesus recorda na parábola da verdadeira videira e dos ramos (cf. Jo 15,2);
7.     Deus está presente à vida do homem: Queria terminar estas reflexões chamando a atenção sobre uma realidade embutida nas aparições: por Maria Deus se faz presente à vida da gente. Não seria necessário se a nossa fé de vez em quando não ficasse fraca e não adormecesse. Mas, visto que isso acontece, eis estes episódios significativos que sacodem nosso sono religioso e nos elevam a patamares de vida mais cristã. O veículo normal da presença de Deus em nosso meio é a Igreja que Cristo “amou e para qual se entregou... para apresentá-la a si mesmo toda bela, sem mancha e sem ruga ou qualquer reparo, mas anta e sem defeito” (cf. Ef 5,25-27). A Igreja, nos basta. Apesar de tantos cristãos que nada tem de santidade e abundam em defeitos. Mas tantas falhas dos homens de Igreja (cristãos e não somente padres) muitas vezes afastam homens de boa vontade do seguimento de Cristo. As aparições têm como finalidade despertar a fé na Igreja apesar das falhas dos seus filhos. Mas, porque tantas aparições de Nossa Senhora e tão poucas de Nosso Senhor? Trata-se, evidentemente de um mistério da vontade de Deus. Mas podemos tentar dar uma explicação que, porém não quer ser resolutiva. Provavelmente Deus permite que seja Nossa Senhora a nos falar e alertar porque ela é mais perto de nós e a sentimos como uma de nós. Sentimo-nos menos ameaçados. É mais fácil vê-la como Mãe que nos alerta, como uma mãe que alerta seus filhos.


[1] Texto elaborado por Dom Luís Ferrando, bispo diocesano de Bragança do Pará – Brasil, por ocasião do Ano Mariano (2012-2015).

Maria e a Igreja: iluminadas pelo mistério de Cristo (Lumem Gentium 52-68)




I. Introdução (Proêmio)
Maria no mistério de Deus (52): Querendo Deus, na Sua infinita benignidade e sabedoria, levar a cabo a redenção do mundo, “ao chegar a plenitude dos tempos, enviou Seu Filho, nascido de mulher,... a fim de recebermos a filiação adotiva” (Gl 4, 4-5). Por amor de nós, homens, e para nossa salvação, desceu dos céus e encarnou na Virgem Maria, por obra e graça do Espírito Santo. Este divino mistério da salvação é-nos relevado e continua na Igreja, instituída pelo Senhor como Seu corpo; nela, os fiéis, aderindo à cabeça que é Cristo, e em comunhão com todos os santos, devem também venerar a memória em primeiro lugar da gloriosa sempre Virgem Maria Mãe do nosso Deus e Senhor Jesus Cristo.
Maria e a Igreja (53): Efetivamente, a Virgem Maria, que na anunciação do Anjo recebeu o Verbo no coração e no seio, e deu ao mundo a Vida, é reconhecida e honrada como verdadeira Mãe de Deus Redentor. Remida dum modo mais sublime, em atenção aos méritos de seu Filho, e unida a Ele por um vínculo estreito e indissolúvel, foi enriquecida com a excelsa missão e dignidade de Mãe de Deus Filho; é, por isso, filha predileta do Pai e templo do Espírito Santo, e, por este insigne dom da graça, leva vantagem á todas as demais criaturas do céu e da terra. Está, porém, associada, na descendência de Adão, a todos os homens necessitados de salvação; melhor, “é verdadeiramente Mãe dos membros (de Cristo)..., porque cooperou com o seu amor para que na Igreja nascessem os fiéis, membros daquela cabeça” (Santo Agostinho). É, por esta razão, saudada como membro eminente e inteiramente singular da Igreja, seu tipo e exemplar perfeitíssimo na fé e na caridade; e a Igreja católica, ensinada pelo Espírito Santo, consagra-lhe, como a mãe amantíssima, filial afeto de piedade.
O objetivo do Concílio (54): Por isso, o sagrado Concílio, ao expor a doutrina acerca da Igreja, na qual o divino Redentor realiza a salvação, pretende esclarecer cuidadosamente não só o papel da Virgem Santíssima no mistério do Verbo encarnado e do Corpo místico, mas também os deveres dos homens resgatados para com a Mãe de Deus, Mãe de Cristo e Mãe dos homens, sobretudo dos fiéis. Não tem, contudo, intenção de propor toda a doutrina acerca de Maria, nem de dirimir as questões ainda não totalmente esclarecidas pelos teólogos. Conservam, por isso, os seus direitos as opiniões que nas escolas católicas livremente se propõem acerca daquela que na santa Igreja ocupa depois de Cristo o lugar mais elevado e também o mais próximo de nós (Paulo VI).
 
II. O PAPEL DE NOSSA SENHORA NA ECONOMIA DA SALVAÇÃO
A mãe do Redentor no Antigo Testamento (55): A Sagrada Escritura do Antigo e Novo Testamento e a venerável Tradição mostram de modo progressivamente mais claro e como que nos põem diante dos olhos o papel da Mãe do Salvador na economia da salvação. Os livros do Antigo Testamento descrevem a história da salvação na qual se vai preparando lentamente a vinda de Cristo ao mundo. Esses antigos documentos, tais como são lidos na Igreja e interpretados à luz da plena revelação ulterior, vão pondo cada vez mais em evidência a figura duma mulher, a Mãe do Redentor. A esta luz, Maria encontra-se já profèticamente delineada na promessa da vitória sobre a serpente (cf. Gn 3,15), feita aos primeiros pais caídos no pecado. Ela é, igualmente, a Virgem que conceberá e dará à luz um Filho, cujo nome será Emmanuel (cfr. Is 7,14; cfr. Mq 5, 2-3; Mt 1, 22-23). É a primeira entre os humildes e pobres do Senhor, que confiadamente esperam e recebem a salvação de Deus. Com ela, enfim, excelsa Filha de Sião, passada a longa espera da promessa, se cumprem os tempos e se inaugura a nova economia da salvação, quando o Filho de Deus dela recebeu a natureza humana, para libertar o homem do pecado com os mistérios da Sua vida terrena.
Maria na Anunciação (56): Mas o Pai das misericórdias quis que a aceitação, por parte da que Ele predestinara para mãe, precedesse a encarnação, para que, assim como uma mulher contribuiu para a morte, também outra mulher contribuísse para a vida. É o que se verifica de modo sublime na Mãe de Jesus, dando à luz do mundo a própria Vida, que tudo renova. Deus adornou-a com dons dignos de uma tão grande missão; e, por isso, não é de admirar que os santos Padres chamem com frequência à Mãe de Deus “toda santa” e “imune de toda a mancha de pecado”, visto que o próprio Espírito Santo a modelou e d'Ela fez uma nova criatura (Santo Irineu). Enriquecida, desde o primeiro instante da sua conceição, com os esplendores duma santidade singular, a Virgem de Nazaré é saudada pelo Anjo, da parte de Deus, como “cheia de graça” (cf. Lc 1,28); e responde ao mensageiro celeste: “eis a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38). Deste modo, Maria, filha de Adão, dando o seu consentimento à palavra divina, tornou-se Mãe de Jesus e, não retida por qualquer pecado, abraçou de todo o coração o desígnio salvador de Deus, consagrou-se totalmente, como escrava do Senhor, à pessoa e à obra de seu Filho, subordinada a Ele e juntamente com Ele, servindo pela graça de Deus omnipotente o mistério da Redenção. por isso, consideram com razão os santos Padres que Maria não foi utilizada por Deus como instrumento meramente passivo, mas que cooperou livremente, pela sua fé e obediência, na salvação dos homens. Como diz S. Ireneu, “obedecendo, ela tornou-se causa de salvação, para si e para todo o gênero humano”. Eis porque não poucos Padres afirmam com ele, nas suas pregações, que “o no da desobediência de Eva foi desatado pela obediência de Maria; e aquilo que a virgem Eva atou, com a sua incredulidade, desatou-o a virgem Maria com a sua fé” (Santo Irineu); e, por comparação com Eva, chamam Maria a “mãe dos vivos” (Santo Epifânio) e afirmam muitas vezes: “a morte veio por Eva, a vida veio por Maria” (São Jerônimo).
Maria na infância de Jesus (57): Esta associação da mãe com o Filho na obra da salvação, manifesta-se desde a conceição virginal de Cristo até à Sua morte. Primeiro, quando Maria, tendo partido solicitamente para visitar Isabel, foi por ela chamada bem-aventurada, por causa da fé com que acreditara na salvação prometida, e o precursor exultou no seio de sua mãe (cf. Lc 1, 41-45); depois, no nascimento, quando a Mãe de Deus, cheia de alegria, apresentou aos pastores e aos magos o seu Filho primogênito, o qual não só não lesou a sua integridade, mas antes a consagrou . E quando O apresentou no templo ao Senhor, com a oferta dos pobres, ouviu Simeão profetizar que o Filho viria a ser sinal de contradição e que uma espada trespassaria o coração da mãe, a fim de se revelarem os pensamentos de muitos (cf. Lc 2, 34-35). Ao Menino Jesus, perdido e buscado com aflição, encontraram-n'O os pais no templo, ocupado nas coisas de Seu Pai; e não compreenderam o que lhes disse. Mas sua mãe conservava todas estas coisas no coração e nelas meditava (cf. Lc 2, 41-51).
Maria na vida pública e na paixão de Cristo (58): Na vida pública de Jesus, Sua mãe aparece duma maneira bem marcada logo no princípio, quando, nas bodas de Caná, movida de compaixão, levou Jesus Messias a dar início aos Seus milagres. Durante a pregação de Seu Filho, acolheu as palavras com que Ele, pondo o reino acima de todas as relações de parentesco, proclamou bem-aventurados todos os que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática (cf. Mc 3,35 e paral.; Luc. 11, 27-28); coisa que ela fazia fielmente (cf. Lc 2, 19 e 51). Assim avançou a Virgem pelo caminho da fé, mantendo fielmente a. união com seu Filho até à cruz. Junto desta esteve, não sem desígnio de Deus (cf. Jo 19,25), padecendo acerbamente com o seu Filho único, e associando-se com coração de mãe ao Seu sacrifício, consentindo com amor na imolação da vítima que d'Ela nascera; finalmente, Jesus Cristo, agonizante na cruz, deu-a por mãe ao discípulo, com estas palavras: mulher, eis aí o teu filho (cf. Jo 19, 26-27) (Pio XII).
Maria depois da Ascensão (59): Tendo sido do agrado de Deus não manifestar solenemente o mistério da salvação humana antes que viesse o Espírito prometido por Cristo, vemos que, antes do dia de Pentecostes, os Apóstolos “perseveravam unânimemente em oração, com as mulheres, Maria Mãe de Jesus e Seus irmãos” (At. 1,14), implorando Maria, com as suas orações, o dom daquele Espírito, que já sobre si descera na anunciação. Finalmente, a Virgem Imaculada, preservada imune de toda a mancha da culpa original (Pio IX), terminado o curso da vida terrena, foi elevada ao céu em corpo e alma (Pio XII) e exaltada por Deus como rainha, para assim se conformar mais plenamente com seu Filho, Senhor dos senhores (cfr. Ap. 19,16) e vencedor do pecado e da morte (Pio XII).
 
III. A VIRGEM SANTÍSSIMA E A IGREJA
Maria e Cristo, o único mediador (60): O nosso mediador é só um, segundo a palavra do Apóstolo: “não há senão um Deus e um mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo, que Se entregou a Si mesmo para redenção de todos” (1 Tm 2, 5-6). Mas a função maternal de Maria em relação aos homens de modo algum ofusca ou diminui esta única mediação de Cristo; manifesta antes a sua eficácia. Com efeito, todo o influxo salvador da Virgem Santíssima sobre 'os homens se deve ao beneplácito divino e não a qualquer necessidade; deriva da abundância dos méritos de Cristo, funda-se na Sua mediação e dela depende inteiramente, haurindo aí toda a sua eficácia; de modo nenhum impede a união imediata dos fiéis com Cristo, antes a favorece.
Sua cooperação na redenção (61): A Virgem Santíssima, predestinada para Mãe de Deus desde toda a eternidade simultâneamente com a encarnação do Verbo, por disposição da divina Providência foi na terra a nobre Mãe do divino Redentor, a Sua mais generosa cooperadora e a escrava humilde do Senhor. Concebendo, gerando e alimentando a Cristo, apresentando-O ao Pai no templo, padecendo com Ele quando agonizava na cruz, cooperou de modo singular, com a sua fé, esperança e ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É por esta razão nossa mãe na ordem da graça.
A natureza da sua mediação (62): Esta maternidade de Maria na economia da graça perdura sem interrupção, desde o consentimento, que fielmente deu na anunciação e que manteve inabalável junto à cruz, até à consumação eterna de todos os eleitos. De fato, depois de elevada ao céu, não abandonou esta missão salvadora, mas, com a sua multiforme intercessão, continua a alcançar-nos os dons da salvação eterna. Cuida, com amor materno, dos irmãos de seu Filho que, entre perigos e angústias, caminham ainda na terra, até chegarem à pátria bem-aventurada. Por isso, a Virgem é invocada na Igreja com os títulos de advogada, auxiliadora, socorro, medianeira (Leão XIII). Mas isto entende-se de maneira que nada tire nem acrescente à dignidade e eficácia do único mediador, que é Cristo (Santo Ambrósio).
Efetivamente, nenhuma criatura se pode equiparar ao Verbo encarnado e Redentor; mas, assim como o sacerdócio de Cristo é participado de diversos modos pelos ministros e pelo povo fiel, e assim como a bondade de Deus, sendo uma só, se difunde vàriamente pelos seres criados, assim também a mediação única do Redentor não exclui, antes suscita nas criaturas cooperações diversas, que participam dessa única fonte. Esta função subordinada de Maria, não hesita a Igreja em proclamá-la; sente-a constantemente e inculca-a aos fiéis, para mais intimamente aderirem, com esta ajuda materna, ao seu mediador e salvador.
Maria tipo/modelo da Igreja como Virgem e Mãe (63): Pelo dom e missão da maternidade divina, que a une a seu Filho Redentor, e pelas suas singulares graças e funções, está também a Virgem intimamente ligada, à Igreja: a Mãe de Deus é o tipo e a figura da Igreja, na ordem da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo, como já ensinava S. Ambrósio. Com efeito, no mistério da Igreja, a qual é também com razão chamada mãe e virgem, a bem-aventurada Virgem Maria foi adiante, como modelo eminente e único de virgem e de mãe. Porque, acreditando e obedecendo, gerou na terra, sem ter conhecido varão, por obra e graça do Espírito Santo, o Filho do eterno Pai; nova Eva, que acreditou sem a mais leve sombra de dúvida, não na serpente antiga, mas no mensageiro celeste. E deu à luz um Filho, que Deus estabeleceu primogênito de muitos irmãos (Rm 8,29), isto é, dos fiéis, para cuja geração e educação Ela coopera com amor de mãe.
A Igreja, virgem e mãe (64): Por sua vez, a Igreja que contempla a sua santidade misteriosa e imita a sua caridade, cumprindo fielmente a vontade do Pai, toma-se também, ela própria, mãe, pela fiel recepção da palavra de Deus: efetivamente, pela pregação e pelo Batismo, gera, para vida nova e imortal, os filhos concebidos por ação do Espírito Santo e nascidos de Deus. E também ela é virgem, pois guarda fidelidade total e pura ao seu Esposo e conserva virginalmente, à imitação da Mãe do seu Senhor e por virtude do Espírito Santo, uma fé íntegra, uma sólida esperança e uma verdadeira caridade (Santo Ambrósio).
A Igreja imita Maria (65): Mas, ao passo que, na Santíssima Virgem, a Igreja alcançou já aquela perfeição sem mancha nem ruga que lhe é própria (cf. Ef 5,27), os fiéis ainda têm de trabalhar por vencer o pecado e crescer na santidade; e por isso levantam os olhos para Maria, que brilha como modelo de virtudes sobre toda a família dos eleitos. A Igreja, meditando piedosamente na Virgem, e contemplando-a à luz do Verbo feito homem, penetra mais profundamente, cheia de respeito, no insondável mistério da Encarnação, e mais e mais se conforma com o seu Esposo. Pois Maria, que entrou intimamente na história da salvação, e, por assim dizer, reúne em si e reflete os imperativos mais altos da nossa fé, ao ser exaltada e venerada, atrai os fiéis ao Filho, ao Seu sacrifício e ao amor do Pai. Por sua parte, a Igreja, procurando a glória de Cristo, torna-se mais semelhante àquela que é seu tipo e sublime figura, progredindo continuamente na fé, na esperança e na caridade, e buscando e fazendo em tudo a vontade divina. Daqui vem igualmente que, na sua ação apostólica, a Igreja olha com razão para aquela que gerou a Cristo, o qual foi concebido por ação do Espírito Santo e nasceu da Virgem precisamente para nascer e crescer também no coração dos fiéis, por meio da Igreja. E, na sua vida, deu a Virgem exemplo daquele afeto maternal de que devem estar animados todos quantos cooperam na missão apostólica que a Igreja tem de regenerar os homens.

IV. O CULTO DA BEM-AVENTURADA VIRGEM NA IGREJA
Natureza e fundamento do culto (66): Exaltada por graça do Senhor e colocada, logo a seguir a seu Filho, acima de todos os anjos e homens, Maria que, como mãe santíssima de Deus, tomou parte nos mistérios de Cristo, é com razão venerada pela Igreja com culto especial. E, na verdade, a Santíssima Virgem é, desde os tempos mais antigos, honrada com o título de “Mãe de Deus”, e sob a sua proteção se acolhem os fiéis, em todos os perigos e necessidades. Foi sobretudo a partir do Concílio do Éfeso que o culto do Povo de Deus para com Maria cresceu admiràvelmente, na veneração e no amor, na invocação e na imitação, segundo as suas proféticas palavras: “Todas as gerações me proclamarão bem-aventurada, porque realizou em mim grandes coisas Aquele que é poderoso” (Lc 1,48). Este culto, tal como sempre existiu na Igreja, embora inteiramente singular, difere essencialmente do culto de adoração, que se presta por igual ao Verbo encarnado, ao Pai e ao Espírito Santo, e favorece-o poderosamente. Na verdade, as várias formas de piedade para com a Mãe de Deus, aprovadas pela Igreja, dentro dos limites de sã e reta doutrina, segundo os diversos tempos e lugares e de acordo com a índole e modo de ser dos fiéis, têm a virtude de fazer com que, honrando a mãe, melhor se conheça, ame e gloria fique o Filho, por quem tudo existe (cf. Cl 1, 15-16) e no qual “aprouve a Deus que residisse toda a plenitude” (Cl 1,19), e também melhor se cumpram os seus mandamentos.
Espírito da pregação e do culto (67): Muito de caso pensado ensina o sagrado Concílio esta doutrina católica, e ao mesmo tempo recomenda a todos os filhos da Igreja que fomentem generosamente o culto da Santíssima Virgem, sobretudo o culto litúrgico, que tenham em grande estima as práticas e exercícios de piedade para com Ela, aprovados no decorrer dos séculos pelo magistério, e que mantenham fielmente tudo aquilo que no passado foi decretado acerca do culto das imagens de Cristo, da Virgem e dos santos (Concílio de Nicéia, em 787). Aos teólogos e pregadores da palavra de Deus, exorta-os instantemente a evitarem com cuidado, tanto um falso exagero como uma demasiada estreiteza na consideração da dignidade singular da Mãe de Deus (Pio XII). Estudando, sob a orientação do magistério, a Sagrada Escritura, os santos Padres e Doutores, e as liturgias das Igrejas, expliquem como convém as funções e os privilégios da Santíssima Virgem, os quais dizem todos respeito a Cristo, origem de toda a verdade, santidade e piedade. Evitem com cuidado, nas palavras e atitudes, tudo o que possa induzir em erro acerca da autêntica doutrina da Igreja os irmãos separados ou quaisquer outros. E os fiéis lembrem-se de que a verdadeira devoção não consiste numa emoção estéril e passageira, mas nasce da fé, que nos faz reconhecer a grandeza da Mãe de Deus e nos incita a amar filialmente a nossa mãe e a imitar as suas virtudes.
 
V. MARIA, SINAL DE SEGURA ESPERANÇA E DE CONSOLAÇÃO PARA O POVO DE DEUS EM PEREGRINAÇÃO.
Maria, Sinal de Esperança e de consolação (68): Entretanto, a Mãe de Jesus, assim como, glorificada já em corpo e alma, é imagem e início da Igreja que se há-de consumar no século futuro, assim também, na terra, brilha como sinal de esperança segura e de consolação, para o Povo de Deus em peregrinação, até que chegue o dia do Senhor (cf. 2 Pd 3,10).
Medianeira/intercessora para a unidade da Igreja (69): E é uma grande alegria e consolação para este sagrado Concílio o fato de não faltar entre os irmãos separados quem preste à Mãe do Senhor e Salvador o devido culto; sobretudo entre os Orientais, que acorrem com fervor e devoção a render culto à sempre Virgem Mãe de Deus (Pio XI). Dirijam todos os fiéis instantes súplicas à Mãe de Deus e mãe dos homens, para que Ela, que assistiu com suas orações aos começos da Igreja, também agora, exaltada sobre todos os anjos e bem-aventurados, interceda, junto de seu Filho, na comunhão de todos os santos, até que todos os povos, tanto os que ostentam o nome cristão, como os que ainda ignoram o Salvador, se reúnam felizmente, em paz e harmonia, no único Povo de Deus, para glória da santíssima e indivisa Trindade.